O livro favorito de Dom Quixote

A figura de Dom Quixote, o famoso cavaleiro andante da literatura espanhola, inspirou muitas obras ao longo dos séculos. Desde a publicação do livro que leva o seu nome, em 1605, até as adaptações para o cinema, teatro e televisão, as aventuras desse personagem encantaram gerações de leitores e espectadores. Mas poucos se perguntaram qual seria o livro favorito de Dom Quixote em sua própria ficção.

Ao longo das páginas de Miguel de Cervantes, vemos referências a muitos livros que Dom Quixote lê e admira. Ele se inspira nas histórias de cavalaria dos séculos passados, como as de Amadis de Gaula e Lancelot do Lago, e sonha em imitar seus heróis. Ele também lê as obras de autores contemporâneos da sua época, como Jorge de Montemayor e Jerónimo de Alcalá, que escrevem sobre o amor e a aventura.

Mas, afinal, qual seria a obra que Dom Quixote mais amava? Existem algumas possibilidades, e vamos explorá-las aqui.

A primeira opção seria a própria história de Dom Quixote. Como o livro é uma obra metaficcional, ou seja, que brinca com a ideia de que o próprio personagem está ciente de que está em um livro, poderíamos supor que ele se considera o protagonista da sua própria história. Nesse caso, o livro favorito seria aquele que o coloca em ação como o herói principal.

Outra possibilidade seria a obra Amadis de Gaula, que é frequentemente mencionada como uma das inspirações de Dom Quixote. Amadis é um cavaleiro da Bretanha medieval que vive aventuras amorosas e guerreiras, e suas histórias foram muito populares no século XVI, quando Cervantes escreveu o seu livro. Dom Quixote poderia ter lido e relido Amadis várias vezes, sonhando em replicar suas façanhas.

Um terceiro candidato seria o poema épico Orlando Furioso, de Ludovico Ariosto. Essa obra italiana foi traduzida para o espanhol na época de Dom Quixote e tinha grande reputação entre os leitores da época. Orlando Furioso conta a história de vários heróis e heroínas que lutam por amor e honra, enfrentando monstros e feiticeiros no caminho. Poderíamos imaginar que Dom Quixote, que passa longas noites acordado lendo, teria devorado esse poema com entusiasmo.

Mas talvez a resposta real esteja em uma obra que é mencionada rapidamente em Dom Quixote, mas que poderia ter um significado profundo para o personagem: a novela pastoril Los Siete Libros de García de Montalvo. Esta obra é uma coletânea de histórias de amor e aventura, ambientadas em um mundo bucólico e idealizado. Ela é citada por Dom Quixote como sendo o melhor livro do mundo, e isso pode não ser uma exageração.

Los Siete Libros de García de Montalvo é um livro que faz uma ponte entre a tradição da cavalaria e da novela sentimental, e é conhecido como um dos exemplos mais puros do gênero pastoril. Ele apresenta um mundo em que a natureza, a harmonia e o amor são os elementos mais importantes, e em que a vida cotidiana é repleta de poesia e beleza. Isso é uma completa inversão da realidade em que Dom Quixote vive, em que a violência, a guerra e a corrupção são uma constante.

Podemos imaginar, então, que Dom Quixote se identificava com os heróis e heroínas de Los Siete Libros de García de Montalvo, que tentam viver em um mundo mais justo e belo. Ele poderia ter encontrado nesse livro uma esperança de que suas próprias aventuras, por mais loucas que fossem, poderiam ter um fim feliz. E aí reside a ironia: os personagens de Los Siete Libros de García de Montalvo são extravagantes, como o próprio Dom Quixote, mas eles vivem em um mundo de fantasia plausível, enquanto Dom Quixote está preso em uma realidade dura e cruel.

Em última análise, nunca saberemos com certeza qual foi o livro favorito de Dom Quixote. Mas podemos ter certeza de que ele teria apreciado as aventuras literárias que exploramos aqui, em busca de respostas. E podemos ter certeza de que ele ainda inspira muitos leitores e escritores em todo o mundo, quatrocentos anos depois da publicação do seu livro.